Foi o fim da picada.
A vida, sempre imprevisível, assim o decidiu.
Estava tudo preparado para eu participar, profissional e pessoalmente, em mais uma nova e gratificante viagem de aventura, a do 6º Raid Todo-o-Terreno do Kwanza Sul, em Angola. Iria reviver, com mais sabedoria e intensidade, a experiência do 3º Raid mas, agora, Rumo às Terras do Fim do Mundo, cumprindo-se assim o desígnio e objetivo de se visitar, nos seus locais mais remotos, belos e inacessíveis, as 18 províncias angolanas.
Mas eis senão quando, de repente e abruptamente, tudo cai por terra e vejo-me, num ápice, a caminho de outras e bem diferentes terras de fim do mundo, metaforicamente falando, em razão de um mundo que me fugiu da mão e que me deixou repentina e totalmente desprogramada e sem quaisquer referências ou coordenadas. Um fim de mundo que não é bonito nem aprazível de se visitar, sentir e vivenciar, ao contrário deste que aqui se desvela. Mas que se revelou, por isso mesmo, o lado de lá do espelho, um importante, salutar e fértil terreno de reflexão, com tempo demais no pouco tempo que sobra. Tão rico, misterioso e vasto como o belo deserto do Namibe.
Desviei-me da rota, por isso, sem saber como nem porquê. Passou por mim, assustador, o meu Adamastor.
Tento agora dobrar o cabo e sair desta tormenta e picada infernal, desviando-me e esmagando todos os caranguejos que me consomem e fazem-me patinar. Aguento-me. Não há atascanço, seja na areia, lama, água ou rocha, que me detenha nesta luta e empreendimento. Também este será superado. E chegará o dia em que retomarei o meu rumo e retornarei às belas e aliciantes picadas das descobertas da vida que me enchem a alma.
Por ora, resta-me revivê-las através de outros olhares e sentires, como é o caso. Volto a viver nos registos e imagens dos companheiros e amigos desta aventura especial e única, aquilo que de indizível senti e sentirei sempre em África e, particularmente, neste contexto concreto, em Angola, nos Raids TT do Kwanza Sul.
A interessante reportagem da RTP1 que se segue, com magníficas imagens e curiosos registos, aborda momentos de muitos dias e quilómetros vividos no 6º Raid, de entre os muitos mais que houve de revelação e de beleza estonteante relevada pelo espírito de aventura e de descoberta , de camaradagem e de partilha, de adrenalina e boa disposição, de amizade e solidariedade, de despojamento e de abertura, de saber e de cultura que caracteriza a alma de viajante da equipa dos promotores, organizadores , patrocinadores e participantes desta iniciativa singular, feita de memórias e laços inolvidáveis, de História e de estórias individuais e comuns, quer nas suas origens, quer nos seus meios, fins e resultados.
De facto, os Raids TT do Kwanza Sul surgem na sequência de um acordo de cooperação estabelecido entre o Governo da Província do Kwanza Sul e o Município de Almada, no âmbito de um protocolo de geminação existente desde 1997 entre este município português e o município angolano de Porto Amboim, e inscrevem-se no quadro da cooperação técnica para a promoção do turismo em Angola. Esta sua génese, tão distinta das que resultam dos habituais pacotes turísticos das agências de viagens, imprimiu uma dimensão institucional e técnica relevantes, quer ainda no tempo da guerra civil, onde o foco, a par do turismo, era a mobilização para o apoio solidário junto das populações mais distantes, carenciadas e isoladas, quer posteriormente, quando se focaliza a importância do desenvolvimento solidário e sustentável, estimulando as potencialidades das economias locais através da promoção de um turismo, nas suas diversas modalidades, amigo do ambiente.
Neste contexto, quando se realizou o 1º Raid, em 2005, só era possível percorrer Angola em viaturas “todo-o-terreno”, bem resistentes e equipadas para todo o tipo de adversidades das estradas esburacadas e das picadas que existiam nessa altura em resultado da guerra e que assim se mantiveram até, pelo menos, 2008.
Hoje, a realidade angolana é bem diferente e as estradas asfaltadas cortam o país de norte a sul e já em muitas direcções, pese embora a imensidão do território, pelo que a necessidade objectiva no uso corrente de viaturas “todo-o-terreno” nas suas estradas entretanto reconstruidas e que ligam as principais cidades, é bem mais relativa. Mas, apesar disso, o espírito que presidiu à origem dos Raids TT do Kwanza-Sul consolidou-se naquilo que de mais aliciante tem e que o distingue do dos padrões e sofisticação do turismo tradicional: o de se manter como expedição e conseguir experiências únicas que, pela aventura que encerram, despertem uma nova atitude e um novo olhar sobre a realidade, a natureza e as pessoas, levando os participantes a lugares com História e estórias mas também a lugares diferentes, recônditos e distantes, onde o convívio com as populações locais, o conhecimento ou percepção da sua cultura ancestral e o usufruto da deslumbrante natureza ainda não desbravada e intocada - onde o imprevisível e o imprevisto latentes despertam resistências adormecidas e desafiam as mais esquecidas capacidades de sobrevivência - resulta em experiências pessoais únicas e inesquecíveis, em várias dimensões.
Fica a reportagem da RTP 1 como testemunho e o ponto de vista pessoal e registos de quem participou neste 6º Raid.
Nele estive diária e virtualmente presente e envolvida, porque é igualmente meu lema, mais do que nunca agora, o grito uníssono SEMPRE NA PICADA. Com toda a carga e possibilidades metafóricas que, estimulantemente, dele emergem.
Desvelo, assim e aqui, no meu espaço, um pouco mais dos meus sentires impulsionados por outros olhares. E reforço a crença na importância dos pontos de vista, de todos os pontos de vista.
Por favor, antes de accionar o vídeo, desligue o som de fundo no final desta página, clicando no sinal II (stop), para que não se sobreponha com os som da reportagem. Obrigada.
Por Terras do Fim do Mundo
"A RTP acompanhou, em Angola, uma expedição de 38 portugueses e angolanos que partiram da província do Kwanza Sul para voltarem às origens, por trilhos todo-o-terreno com o lema "sempre na picada". Em quinze dias foram percorridos 5800 km numa expedição cheia de aventuras ao volante de 16 viaturas todo-o-terreno pelas províncias mais longínquas de um país em reconstrução.
Entre os locais visitados, destaque para a entrada no extremo sul, o Bico de Angola, na fronteira com a Zâmbia e Namíbia . E aí , a visita às ruínas do que já foi o quartel-general de Jonas Savimbi.
Marcante foi também a chegada ao Cuito Cuanavale , onde foi travada a segunda maior batalha , uma das mais sangrenta , de toda a África.
Inesquecíveis, as paisagens naturais do Lubango como a fenda da Tundavala ou o encontro imediato com elefantes da faixa de Caprivi , já na Namíbia.
Dez anos depois do fim da guerra civil, a aventura levou estes 38 "filhos da terra" a redescobrir trilhos de difícil acesso, por 18 províncias angolanas. Esta foi a sexta edição do Raid Kwanza Sul, que vem somando todas as províncias de Angola desde 2005.
Completados estão, com esta edição, os quatro cantos do país, sendo todos testemunhas privilegiadas das muitas transformações que estão a acontecer em Angola.
Entre os raidistas presentes, Miguel Anacoreta Correia - Secretário Geral da UCCLA , o gestor Pedro Norton de Matos bisneto do general Norton de Matos e representantes do protocolo de cooperação estabelecido entre a Câmara Municipal de Almada e o Governo da Província angolana do Kwanza Sul.
A autoria da reportagem é da equipa: Jornalista Diana Palma Duarte, com as imagens do repórter de imagem António Antunes e a montagem do editor de Imagem Pedro Pessoa. "
As capas das 4 edições (Pangeia e Chá de Caxinde), dos livros dos 3º, 4º, 5º e 6º Raid TT do Kwanza Sul, onde tudo se conta e consta.
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